terça-feira, 26 de novembro de 2013

Querida avó

A bela carta que Alice Maravilhas nos deixa como fecho de abóbada das suas Elegias do amor e do ódio. Tocante. MG
 
 
Querida avó
 
Escrevo esta carta como forma de me chegar a ti, estar perto e de mão dada a lembrar-me quanto foste importante.
Tenho percorrido momentos felizes que me estruturam no dia a dia porque sei que estás a ajudar-me a transmutar as raivas, e de nó na garganta solto-me, e volto a sentir os momentos passados, das minhas vestes de amor e ódio.
Querida avó hoje senti-me longe, alguém me deu a tristeza no coração e ele chorou. Deixei-me levar pela insegurança dos meus sentimentos, esbanjei o amor no medo e rezingona instaurei as palavras do ódio. Culpei-me e culpei as instruções da cabeça
Viro e reviro as pregas do espaço e do tempo e situo-me nos vários pontos cardeais, no amor e no ódio em que me consumo.
Avó apetece-me encostar a minha cabeça no teu peito e soletrar o que sinto, limpar-me ao som de música e vontades e acolho a tua mão na minha face sedenta.
Aperto-me num nó que demora a soltar-se, minha querida avó, corro para o véu que esconde a fragilidade do coração.
Levanto-me e é no amor que me encontro. Avó, explica-me como me encontro e como me posso entregar sem medo, sem o receio de ser, de me expor e despojar dos desencontros da alma, aqueles que me levam a sentir bem, livre do medo da rejeição. Entorno-me em desalinhos de pele desidratada pelo cansaço de ser, pela vida que esculpe o amor e quando dói, porque dói, então agarro a tua mão e o mundo fica cheio e volto a sentir que sou.
 
Avó ainda me sinto perdida no amor, na lentidão de calçar os sapatos sem medo de caminhar.
 
Alice Maravilhas, Lisboa, Novembro de 2013 

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