segunda-feira, 12 de maio de 2014

Espelho meu, há alguém com mais sorte do que eu?

Do excelente conto de Ana de Sienna, mais um extracto - enquanto aguardamos pelo livro antológico onde o texto constará na integra. MG
 
 
 
[...]
 
Claro que vou ficar neste mundo eternamente. Se isto for um sonho, por favor, não me acordem! E quando chegará até mim esse alguém, meu cantor?

Quando for a hora é a resposta.

Espero com muita calma e, enquanto espero, vejo uma figura envolta em neblina a andar na minha direcção. Caminha decidida e eu sinto que é importante o que tem para me dizer. Quando chega junto de mim, vejo que é um homem. Beija-me ao de leve nos lábios, sem uma palavra. Instintivamente, retribuo o beijo e percebo que o conheço há muito tempo. Há tanto tempo, que nem sei precisar quanto. Vários anos, talvez até séculos ou milénios… Que sensação tão maravilhosa e, ao mesmo tempo, tão estranha. É um reencontro? Já nos conhecíamos e só agora nos voltamos a encontrar? Tudo nele me é familiar: os lábios, o beijo, o cheiro, o toque, o que vejo no fundo dos seus olhos claros. O prazer do seu toque é imenso, o seu olhar é reconfortante… Tudo e nada me diz que é com ele que a felicidade pode chegar. Que vale a pena tentar. Não sinto medo, não sinto hesitação, sinto vontade de arriscar.

E ele diz-me:

Sou a tua alma gémea. Tenho-te visto sofrer e, finalmente, venho ao teu encontro. Confia em mim. Não te vou deixar. Quero ficar contigo para sempre.

Dou por mim a pensar: Isto só pode ser um folhetim ou uma novela daquelas bem pimba… Acorda e regressa à realidade. Tento abrir os olhos, belisco-me, mas nada acontece. Tudo se mantém igual.

Entretanto, ele já me envolveu nos seus braços e acaricia-me de uma forma nunca antes sentida, enfim, um descalabro! Rendo-me ou resisto? Se resistir, não me vou arrepender para o resto da vida? Mas será isto realmente a minha vida ou trata-se apenas um sonho, um delírio dos quarenta, uma maluqueira repentina, eu sei lá!?

Olho-me novamente no espelho e falo com ele: «espelho meu, diz-me se há alguém com mais sorte que eu?»
[...]

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